As empresas familiares compõem a base da economia brasileira, representando cerca de 90% dos negócios em operação e gerando mais de 50% dos empregos no país. Ainda assim, a sucessão para a geração seguinte se configura como um grande desafio para essas empresas, o que compromete a perpetuação desses negócios. Estima-se que apenas 30% das empresas familiares sobrevivem à primeira geração e 12% à segunda. Logo, esses dados revelam, claramente, a necessidade das lideranças empresariais darem atenção especial aos seus processos de sucessão.
O processo sucessório, frequentemente, é um terreno árido e repleto de desafios. Especialmente, no Brasil, esse processo é ainda mais complexo devido a uma série de fatores culturais, econômicos e estruturais. A sucessão em empresas familiares envolve não apenas a transferência de controle e propriedade, mas, também, a continuidade dos valores da família e da cultura organizacional estabelecida.
Principais obstáculos para a sucessão nas empresas familiares
Do ponto de vista empresarial, a dificuldade começa com a falta de planejamento, ou seja, a maioria das empresas não possui um plano de sucessão formalizado. Muitas vezes, esse não planejar é fruto da falta de profissionalização da gestão e da resistência à mudança por parte dos fundadores ou da geração mais velha.
A falta de uma estrutura de governança corporativa sólida é um problema. Grande número de empresas familiares no Brasil ainda opera em estruturas informais, com poucos processos, diretrizes e políticas claras, dando preferência por práticas de gestão ultrapassadas e incompatíveis com as complexidades da administração moderna, que prejudicam a inovação, o crescimento e a continuidade da empresa.
O aspecto tributário e legal do processo sucessório pode ser um obstáculo significativo. O sistema tributário brasileiro é conhecido por sua complexidade. A transferência de propriedade e controle pode acarretar altos custos fiscais, especialmente, se não for planejada com antecedência. Questões como herança, divisão de patrimônio e acordos pré-nupciais também podem complicar o processo, levando a disputas legais prolongadas e custosas.
Um outro desafio comum é a falta de preparo da geração mais nova para assumir o comando das empresas, pois os fundadores não preparam seus sucessores adequadamente, deixando lacunas em sua formação que comprometem a continuidade dos negócios. Nem sempre os membros da família possuem as habilidades, competências e conhecimentos necessários para assumir cargos de liderança na empresa. Embora muitos herdeiros e herdeiras possam ter o desejo de assumir o controle dos negócios da família, eles podem não possuir as qualificações necessárias para liderar eficazmente. Isso pode levar a um declínio no desempenho da empresa e até mesmo ao seu fracasso, se as lacunas de competência não forem abordadas e trabalhadas adequadamente.
Além disso, questões emocionais e familiares podem obscurecer a visão objetiva sobre quem é o melhor candidato ou candidata para liderar a empresa no futuro, resultando em conflitos de interesse, rivalidades, ressentimentos e instabilidade organizacional, que impactam negativamente na continuidade das operações empresariais.
A falta de comunicação eficaz dentro da família e da empresa é outro ponto de destaque. A ausência de canais de comunicação claros pode dificultar a resolução de conflitos e a construção de consenso em torno de decisões importantes.
Diante de tantos desafios, o que fazer?
Para superar os desafios do processo sucessório, as empresas familiares brasileiras precisam investir em medidas que ‘preparem o terreno’ para uma sucessão equilibrada, suave e eficaz, como:
- Realizar o planejamento sucessório, criando um plano formal que defina critérios objetivos para a escolha do sucessor ou da sucessora, estabelecendo um cronograma para a transição que inclua uma comunicação competente e ferramentas de resolução de conflitos.
- A governança corporativa é um elemento chave. Sem uma estrutura clara e regras bem definidas, a tomada de decisões pode se tornar caótica e baseada em interesses pessoais, em vez do melhor para a empresa. A implementação de boas práticas e a separação entre família, propriedade e gestão são condutas recomendadas para garantir uma transição tranquila e profissional.
- Atenção à gestão de expectativas. É comum haver divergências entre os membros da família empresária sobre os seus papéis na estrutura corporativa, os rumos do negócio e a estratégia da empresa, o que pode resultar em disputas pelo poder.
- Investir numa comunicação aberta, transparente e eficaz, que estimule o diálogo entre as gerações sobre o futuro da empresa, seus valores e objetivos, de maneira clara e respeitosa, para evitar mal-entendidos e ressentimentos. Logo, uma comunicação eficaz entre as gerações é fundamental para alinhar os desejos e anseios de todos os envolvidos.
- Profissionalizar a gestão, investindo na formação e desenvolvimento dos membros da família que desejam participar da empresa, além de abrir espaço para profissionais externos com competências complementares, essencial para garantir a continuidade do negócio.
- Implementar mecanismos eficazes para lidar com os conflitos familiares de forma justa e transparente, preservando a coesão familiar e o bem-estar dos negócios da família.
- Promover uma cultura organizacional flexível e adaptável às novas demandas do mercado, sem perder de vista os valores e princípios que fundamentam a empresa.
Para finalizar, ressalto que, embora a sucessão nas empresas familiares brasileiras apresente desafios consideráveis, ela também se configura como uma oportunidade de crescimento e renovação. Ao abordar esse processo de forma estratégica, proativa e preparando o terreno para a transição, as famílias podem fortalecer seus negócios, garantir a perenidade da empresa e construir um futuro próspero para as próximas gerações, evitando, desse modo, a materialização da máxima popular: pai rico, filho nobre, neto pobre… e revoltado.
Seguimos…